A camisa de Jordan Myles e a simbologia do racismo

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Você conhece Jordan Myles?

Se você assistiu ao NXT nos últimos meses, provavelmente deu de cara com algum combate em que ele esteve presente. Se não faz a menor ideia de quem seja, fique tranquilo, vou lhe apresentar agora.

Albert Christian Hardie Jr. é um lutador de 31 anos de idade, que durante grande parte da sua carreira fez sucesso com a alcunha de ‘ACH’. Lutou na Ring of Honor, Impact Wrestling, New Japan Pro-Wrestling e chegou à WWE em 2019.

Suas primeiras aparições foram em um torneio para novas estrelas da atração. No NXT Breakout Tournament, Albert – já com seu novo nome, Jordan Myles – derrotou Cameron Grimes na final para se tornar o grande vencedor.

O começo era promissor. Myles fazia o caminho natural de um lutador sai das promoções indies para empresas de maior investimento e crescem gradativamente no ramo.

Até que o NXT começou a ser exibido na USA Network.

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Em setembro, a WWE começou a exibir o NXT semanalmente na USA Network. O show ganhou 2 horas semanais para competir com o novo concorrente da companhia na televisão, o AEW Dynamite.

A mudança, no entanto, gerou também algumas alterações no modelo do NXT.

Por se tratar de um show televisionado, agora o NXT precisa lucrar. Dessa forma, produtos de merchandising foram introduzidos para todos os lutadores da atração, incluindo Jordan Myles.

E foi aí que todo o problema começou.

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Na tarde do último domingo, Myles publicou um tweet protestando contra a comercialização da sua camisa no wweshop.com, pois seu design tinha um cunho racista.

“Eu continuarei postando até eu ser ouvido. Eu não sinto muito por nada que eu disser ou fizer. Representatividade é importante. Se essa é a visão de Vince McMahon e Triple H sobre mim, então isso é um tapa na cara de todo fã, lutador ou apoiador afro-americano” – Jordan Myles.

Incomodado, o lutador continuou a publicar tweets protestando contra a venda da camisa, e convocou apoiadores a utilizarem as fotos em preto e branco com a hashtag “#fortheculture”, em apoio à luta contra o racismo.

Mas não faltaram respostas argumentando que não há nada de racista na imagem. No entanto, a camisa promocional feita para Myles é uma aula de como o racismo também pode ser simbólico e velado.


Não sabe por que? Continua aqui que titio explica.

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Existem diversas maneiras de cometer um ato de racismo. Entretanto, para a maioria das pessoas, apenas uma injúria racial, ou seja, quando se ofende diretamente alguém, pode ser considerado racismo.

Mas não é assim que a banda toca. O racismo também é estrutural, passa por muitas outras formas – inconscientemente, inclusive. Desde olhar torto para uma pessoa negra que está com roupas menos formais até fazer seu campeão mundial negro perder em 5 segundos para outro adversário. Tudo isso pode ser enquadrado como racismo.

A camisa de Jordan Myles também.

Mas, para entender melhor o porquê, precisamos voltar para os séculos XIX e XX.

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Em meados do século XIX, um homem novaiorquino chamado Thomas D. Rice introduziu um novo estereótipo nos Estados Unidos.

Durante uma passagem pelo sul do país, Rice observou que escravos estadunidenses cantavam uma música sobre um personagem chamado Jim Crow. Ele era assim chamado devido aos donos de escravos compará-los com corvos.

Rice, que era humorista, voltou para Nova Iorque com um novo personagem: Jim Crow. Um escravo negro, malandro, com um jeito abobalhado de andar. Por ser branco, Rice pintava seu rosto de negro, introduzindo ao mundo o blackface.

Sim. Em 1997, Triple H e a D-Generation X promoveram um momento bizarro de racismo na WWE, em que eles fizeram um blackface em um show televisionado para ridicularizar a Nation of Domination, rivais da DX na época.

O sucesso foi tanto que a imagem do negro estadunidense foi associada aos estereótipos mostrados no show de Rice.

Foi, inclusive, inspiração para o nome das leis de segregação racial dos Estados Unidos, as chamadas Jim Crow Laws. Elas ordenavam a separação entre bancos e negros, proibia o acesso dos afro-americanos em determinados lugares, como escolas e universidades.

E também foi inspiração para um livro infantil de bastante sucesso nos Estados Unidos do século XX.

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Em 1898, The History of Little Black Sambo, a história de um menino que se livrava de três tigres com suas habilidades, foi lançado nos Estados Unidos.

A história, no entanto, não é uma exaltação à bravura de um menino que se livrava de famintos e perigosos animais. Era uma exemplificação de como uma história pode criar esterótipos.

Assim como Jim Crow, Sambo era conhecido pela sua malandragem, inocência, irresponsabilidade e alegria.

A representação do negro estadunidense no século XX – “The smoking Sambo”

E isso bastou para Sambo (ou Coon) se tornar uma forma de expressão racista no imaginário estadunidense.

A caricatura de Sambo – um homem negro, de pele muito escura, lábios gigantes e vermelhos, além de um grande sorriso e suas roupas de malandro – fizeram parte da propaganda do país durante muito tempo.

E, com isso, chegamos à camisa de Jordan Myles.

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O design da camisa de Albert é simples: Uma camisa preta, com uma estampa de uma forma vermelha e seu ringname, Jordan Myles, escrito de forma estilizada dentro.

O problema é que a camisa e o design remetem diretamente à imagem colocada acima, de Sambo.

E isso foi o que revoltou Myles. Como que uma empresa desenvolve uma camisa para um lutador negro em que seu design remete diretamente a um estereótipo racista do país?

O lutador decidiu não se calar e com razão.

A WWE, no entanto, postou um comunicado informando que Jordan sabia e aceitou o design presente na camiseta.

O lutador mostrou que aquilo não apenas era uma mentira deslavada da WWE, como também denunciou ter sido enganado quando estava negociando como ela seria.

“Não acredita em mim? Mande um e-mail e pergunte a ele você mesmo. Vai se fuder, Baker!” – Jordan Miles / E-mail mostra que Myles tinha uma outra versão do logo, que Triple H queria, mas precisaria apenas fazer alguns ajustes.

Isso mostra que há um caminho longo a ser percorrido na luta contra a discriminação, mesmo que velada.

É preciso entender que o racimos é estrutural, não apenas uma relação de injúria. Está em cada momento de uma sociedade que não aprendeu a respeitar o povo negro, seja em sua história ou cultura.

Por isso, insiste em reforçar estereótipos de comportamento e estética, mesmo que digam não saber do que se trata.

Albert Hardie, no entanto, decidiu não se calar diante disso.

E nós também não nos calaremos.

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Referências para o texto:

https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2015/10/voce-e-racista-so-nao-sabe-disso-ainda.html

Geledés – Reconhecendo estereótipos racistas

2 comentários em “A camisa de Jordan Myles e a simbologia do racismo”

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