Quando as diferenças são meros detalhes

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escrito por Peter (@petermynameis)

 

A luta livre é um universo especial, um verdadeiro mar de possibilidades e oportunidades. Pense bem, em que outro lugar podemos ver uma mistura tão grande de diferentes atletas com características tão distintas? Não há uma separação específica entre lutadores, o que torna as lutas algo tão interessante de se ver. Gente dos mais diferentes tamanhos e pesos, com os mais diversos estilos de luta, competem frente a frente promovendo o melhor espetáculo possível para o público. Até mesmo a divisão de gêneros ocasionalmente é rompida quando wrestlers femininas lutam contra wrestlers do sexo oposto, como já ocorreu com atletas como Chyna, Lita, Awesome Kong, Sara Del Rey, Candice LeRae, entre várias outras.

Como já dito, a luta livre abre um enorme leque de oportunidades para um vasto número de atletas, muitos desses que não teriam a mínima chance de brilhar em outras modalidades esportivas. Por algum problema de saúde ou por determinadas características que fogem do padrão imposto pela sociedade (que acabam sendo refletidos nos esportes), esses atletas acham refúgio nos ringues de pro wrestling onde são melhor aceitos por trazer algo diferente consigo. Essas diferenças, que beneficiam ainda mais o esporte, serão o foco principal desse artigo de hoje. Sendo assim, boa leitura!

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Vamos começar falando sobre os gigantes do ringue. Não, não estou falando da federação “Gigantes do Ringue”, estou falando dos lutadores extremamente grandes que já participaram de uma luta de wrestling profissional. Eles não são apenas pessoas com altura elevada, eles portam a condição conhecida como gigantismo (ou acromegalia, caso ocorrida na fase adulta), que se caracteriza pelo crescimento exagerado do corpo em comparação a uma pessoa de estatura média. Não só na altura especificamente, o crescimento pode ser dado em membros do corpo como mãos, pés e cabeça. Um exemplo disso é o lutador Maurice “The French Angel” Tillet, que tinha essa disfunção, medindo apenas 1,70 de altura. Tillet, aliás, pode ser considerado um dos primeiros acromegálicos a se aventurar em um ringue, transformando sua aparência “deformada” em trunfo para sua carreira.

 

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Por esse crescimento exagerado no corpo, a saúde se torna mais frágil do que a de um ser humano de altura mediana, levando essas pessoas em muitos casos a terem uma morte prematura. Além disso, o mundo não é adaptado para eles, definitivamente. Exemplificando isso, temos a história que Hulk Hogan conta sobre a viagem da lenda Andre the Giant (talvez o gigante mais famoso da história da luta livre) para o Japão. O banheiro do hotel em que Andre estava hospedado era pequeno demais para ele, e ele realmente necessitava usá-lo. Sendo assim ele não viu outra opção a não ser forrar a cama do quarto com jornal, e bem… defecar ali mesmo. Acredito que essa imagem vai ficar muito tempo na sua cabeça, me perdoe, mas foi necessária para mostrar que realmente não é nada fácil ser um gigante em um mundo em que todos tornam-se basicamente anões para você.

Além de Andre, temos muitos outros nomes de lutadores com a mesma característica que já passaram pela WWE, como o argentino Giant Gonzalez (com 2,31 de altura, talvez o maior pro wrestler da história da WWE ou mesmo da luta livre), o brasileiro Giant Silva, The Great Khali, e na atualidade, Big Show. Eles podem não ser os atletas mais ágeis do mundo, algo que em outros esportes poderia ser uma enorme barreira, porém seus portes avantajados se encaixam perfeitamente no espetáculo do wrestling profissional. É nesse ambiente que eles melhor são adaptados, mesmo sendo na maioria das vezes anunciados como “monstros inabaláveis” ou clichês estereotipados do tipo.

 

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Completamente opostos aos gigantes, os lutadores com nanismo (ou variações da condição) são também parte fundamental da luta livre. Esses pequenos grandes lutadores se aventuram em ringues desde a década de 40, fazendo parte da história do wrestling profissional contra todos os obstáculos em suas vidas. Sky Low Low e Little Beaver, dois lutadores de baixa estatura, eram tão aclamados no ringue que até, supostamente, tiveram a presença da Rainha Elizabeth II na plateia de uma de suas lutas durante uma turnê pela Inglaterra (essa história não é tão absurda assim, levando em conta a paixão da Rainha pela luta livre). Esses dois wrestlers, ao lado de outras lendas dos primórdios da luta livre como Lord Littlebrook e Fuzzy Cupid, fazem parte do Pro Wrestling Hall of Fame and Museum, um seleto grupo de nomes memoráveis do esporte que vão de Bruno Sammartino à Hulk Hogan. Local esse onde grandes estrelas como The Rock, Sting e Undertaker, por exemplo, ainda nem fazem parte.

 

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Pelo mundo da luta livre, os “mini-wrestlers” são inseridos em divisões próprias com seus próprios cinturões e rivalidades, mesmo tratamento dado às mulheres. Aliás, existem até federações constituídas exclusivamente de pessoas de baixa estatura, como a Micro Wrestling Federation, a Half Pint Brawlers e a Extreme Midget Wrestling Federation. Vocês podem pensar nisso como uma espécie de segregação, mas o fato é que essa separação dá chance a um maior número de atletas. Na WWE por exemplo, onde não há uma divisão específica para os intitulados midgets, esses lutadores são postos na grande maioria das vezes em situações cômicas ou em feuds sem a menor importância. É o caso de nomes como Max Mini, Dink the Clown, Hornswoggle, e o mais recente de todos, El Torito. Mesmo sendo colocados como uma simples piada, principalmente nos EUA, por anos esses lutadores passam por cima de qualquer dificuldade e marcam presença na luta livre. Como é dito naquele velho e conhecido ditado, tamanho não é documento.

 

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A obesidade excessiva, quando em um patamar muito elevado, traz consigo um grande risco de morte para as pessoas. Pode-se pensar que uma doença que tanto restringe os movimentos e a saúde de um individuo não teria chance no mundo da luta livre, mas por várias vezes ela encontra seu espaço, tendo vários atletas que se destacavam pelo seu grande peso ao longo dos tempos. Esse é o caso de Happy Humphrey, o “atleta mais pesado de todos os tempos”, com seus 340 kgs em seus tempos gloriosos de ringue. Outro exemplo são os MCGuire Twins, apontado pelo Guiness Book como os gêmeos mais pesados do mundo, somando mais de 660 kgs juntos.

 

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Na WWE, vários nomes são lembrados quando o assunto é sobrepeso. Temos lutadores clássicos como King Kong Buddy, a tag The Natural Disasters, Yokozuna e outros membros da família Anoa’i, e até algumas divas, como Bertha Faye e Kharma. Porém, um nome em especial retrata a vida desses atletas, no ringue e fora dele: Big Daddy V. Talvez ele tenha sido o primeiro wrestler que veio a sua mente nessa parte do nosso artigo, pois ele teve um grande destaque durante sua carreira na WWE pelo seu enorme porte físico. Nelson Frazier Jr (seu nome verdadeiro), infelizmente nos deixou aos 43 anos em 2014, vitima de um ataque do coração. Esse é o retrato do quão arriscado pode ser a vida desses atletas, algo que nem passa pela cabeça dos fãs que somente procuram pelo entretenimento de vê-lo lutar no meio de um ringue.

 

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Atletas com amputações não são tão raros de aparecerem em ringues de grandes federações de pro wrestling. De tempos e tempos, surgem alguns exemplos de lutadores com essa característica, demonstrando que mesmo com certas dificuldades podemos alcançar nossos objetivos se batalharmos por eles. Atualmente, o exemplo mais notável é o lutador Chris Melendez, que desde 2014 faz parte da TNA, segunda maior empresa de luta livre na América do Norte. Ex-sargento do exército americano, ele sofreu um acidente no Iraque em 2006 causado por um artefato explosivo, causando a amputação da sua perna esquerda. Após anos de treino, ele estreou na TNA competindo desde então no mesmo nível dos demais adversários, uma inspiração para muitas pessoas.

 

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Porém, ao contrário do que muitos fãs possam pensam, Chris Melendez não foi o primeiro wrestler sem uma perna a participar da TNA, ou mesmo do mundo do pro wrestling. Zach Gowen, um jovem com o membro inferior esquerdo amputado em consequência de um câncer, no longínquo ano de 2003 já fazia sua estreia em um ringue. Zach demonstrava uma agilidade surpreendente mesmo se equilibrando em uma única perna, executando golpes que muitos atletas com duas não fazem, como moonsaults. Após um breve tempo na TNA, Gowen assinou com a WWE, onde teve uma passagem igualmente rápida, porém com alguns bons méritos individuais. Ele não competiu por algum cinturão, porém lutou ao lado de lendas como Hulk Hogan e Kurt Angle, e competiu contra grandes nomes como John Cena, Brock Lesnar e até mesmo Vince McMahon, o que já é alguma coisa. Após sua saída, teve participações esporádicas novamente na TNA e também na ROH, e hoje atua em empresas de menor expressão. Na cena independente, ele formou dupla com outro lutador inspirador, Gregory Iron, atleta que mesmo com o braço direito parcialmente paralisado causado por paralisia cerebral, mostra seu talento frente ao público. Eles se intitulam os “Handicapped Heroes”, algo como os “Herois em Desvantagem” em uma tradução livre para o português. Os dois wrestlers formaram uma federação própria, a Warriors for Wrestling, que arrecada fundos com o dinheiro ganho nos shows para clinicas e hospitais que tratam crianças com deficiências.

 

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Com o mesmo espírito da Warriors for Wrestling de quebrar preconceitos e ajudar a quem precisa, desde 1991 existe no Japão uma federação sem fins lucrativos chamada Doglegs. Ela se diferencia por dar chance para que pessoas com algum tipo de deficiência possam se expressar por meio da luta livre, e mostrarem seu valor em frente a uma sociedade que os subestima. Assim, pessoas com paralisia cerebral, esclerose múltipla, paraplegia, etc, participam das lutas da mesma forma que uma pessoa sem nenhuma deficiência, como uma forma de superação e diversão. Em uma primeira vista, pode ser chocante as cenas que vemos em cima do ringue dessa empresa, levando em conta que estamos tratando de puroresu. Porém, é nítido que o choque é o principal ponto da Doglegs, transformar a piedade cotidiana que eles recebem de toda a sociedade em respeito mútuo. Um documentário chamado Doglegs foi feito no ano passado, mostrando a vida de alguns desses atletas.

 

 

Antes de terminamos, tenho que deixar registrado que pode ter ocorrido algum erro em relação às condições físicas relatadas, porque infelizmente eu não me formei em medicina para conhecê-las mais profundamente. Entretanto, elas se baseiam em pesquisas feitas por mim, que teve o cuidado de procurar não escrever nenhuma bobagem. De qualquer forma, esse não é o foco principal do artigo, e sim como elas podem ser bem aceitas pelo universo da luta livre, e se tornarem meros detalhes comparadas ao espetáculo propiciado pelos lutadores. Não há barreiras quando você foca em seus sonhos, acredite em você. Obrigado pela atenção, e até mais!

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