Sentimento de nostalgia: Uma crônica do Royal Rumble

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Janeiro de 2008.

Um jovem Angelus vai em direção à casa de um amigo após um convite para jogar PlayStation 2. O jogo em questão era um com um nome complicado, mas que parecia promissor: SmackDown vs. RAW 2008. Poucos dias depois de passar aquela tarde aprendendo as mecânicas e entrando naquele mundo fantástico de homens mascarados e mortos-vivos que se batem dentro de um ringue, eis que passa na TV o seguinte comercial: WWE – Luta Livre na TV, com comentários de Jarbas Duarte e Michel Serdan. Ali se iniciou uma grande paixão.

A primeira rivalidade que acompanhei dentro da luta livre envolvia dois nomes: Edge e Undertaker. Uma rivalidade que culminou em uma disputa pelo World Heavyweight Championship (sdds) na WrestleMania XXIV. E o que me prendeu a atenção, por incrível que pareça, não foi o herói sobrenatural conhecido como Undertaker, embora eu gostasse (e ainda gosto) muito do wrestler, mas foi justamente Edge que roubara minha atenção. Não só pela música agressiva que o mesmo usava em suas entradas, mas na cabeça de um moleque de 12 anos só passava o seguinte pensamento: como um cara pode ser tão desprezível e mal? E porque eu gosto tanto dele apesar de odiá-lo na mesma medida ?

Muitos que conversavam comigo quando descobriam que me tornei um aficionado por luta livre, sempre viam com o mesmo papo: “mas tu sabe que isso é tudo falso, né?”. E até hoje é assim. E sim, eu sei que é tudo falso. E isso não me impede de amar e ficar emocionado com diversos momentos que ocorrem dentro desse espetáculo. Há muitos momentos que trouxeram lágrimas, alegria, euforia e fizeram fãs de wrestling profissional pularem, baterem palmas e berrar. Seja assistindo pela Network em casa ou ao vivo no estádio.

A vitória de Chris Benoit na WrestleMania XX. O retorno de John Cena no Royal Rumble 2008. O retorno dos Hardy Boyz na WrestleMania 33. Ora, a vitória de Kofi Kingston na WrestleMania 36, que arrancou lágrimas de diversas pessoas, incluindo este que vos fala. E é por isso que venho falar um pouco com vocês sobre isso.

Janeiro de 2020.

Dia 26.

Dia de Royal Rumble.

O domingo, dia 26 de janeiro, havia começado de forma eufórica por muitos fãs, incluindo eu e meus amigos do WrestleAmigos, nosso grupinho de Whatsapp. Eis que, durante a tarde, um baque: é anunciada a morte de Kobe Bryant, ex-jogador do Los Angeles Lakers. Junto com ele, faleceu Gianna Bryant, sua filha de 13 anos. Ambos vieram a falecer em um acidente de helicóptero enquanto se dirigiam para um jogo de basquete onde Gianna jogaria. Agora pense como todos nós ficamos. Não havia ânimo, não havia clima, não havia nem vontade de assistir qualquer coisa. Foi um domingo que, mais rápido do que veio se tornou sombrio.

Eis então que chega a hora do Royal Rumble e lá fomos nós, sem metade da animação que tínhamos antes. E porque eu estou falando tudo isso? Vocês vão entender.

O evento correu todo correu com pequenas demonstrações de ânimo, seja por uma luta aqui, uma vencedora da Rumble feminina ali (cof cof) e por aí vai, mas tudo sem muita empolgação. Então vem a hora da 30-Man Royal Rumble Match. A luta começa com quase meia hora de Brock Lesnar limpando o ringue sem realizar o menor esforço. E é aí que entra o que eu vim falar: o quanto o pro-wrestling mexe com as nossas emoções. Lembrando que estou usando de base o grupo do qual faço parte, não sei como vocês aí reagiram com a luta. Se quiserem comentar conosco, fiquem à vontade, vai ser ótimo ouvir.

Toda a primeira parte da luta transcorreu comigo e meus amigos simplesmente putos da cara porque simplesmente ninguém conseguia parar Lesnar. Cada um que entrava, era uma esperança em vão. Eis que entra então Kofi Kingston. Todos nós vibramos pensando que aquela seria a hora. Em seguida, Rey Mysterio. E pouco tempo depois, Big E. Ali, todo estava com um sorriso no rosto pensando: é agora. Aquele momento em que os três se uniram contra Lesnar para tentar tirar o WWE Champion do ringue nos deixou eufóricos. Com a sequência de finishers e uma possível eliminação. Após Lesnar se sobressair e eliminar os três, lá estávamos nós: irritados e incrédulos, tentando entender quem diabos bookou aquela luta.

Uma nova esperança surgiu com a entrada do NXT North American Champion Keith Lee, que poderia bater de frente com Lesnar. Lá estávamos nós sorrindo de novo, sorriso esse que aumentou com a entrada de Braun Strowman. Dali, Lesnar não passaria. Novamente erramos, pois aquele rápido momento de alegria logo se foi no momento em que Lesnar eliminou os dois gigantes. Quando tudo parecia estar perdido e eu mesmo dizia que iria desistir deste Royal Rumble. Dois homens nos trouxeram o que achávamos que seria o ápice da noite: em um grande momento, Ricochet aplica um Low Blow em Lesnar, seguido por um Claymore de Drew McIntyre, eliminando o ex-UFC e dando um início oficial à Royal Rumble Match de 2020.

E quando achamos que não tinha como ficar melhor, eis que entra o vigésimo primeiro wrestler da luta: Edge. Se você assiste WWE há algum tempo, você provavelmente viveu o momento triste que foi o anúncio da aposentadoria de Edge em 2011 após uma lesão no pescoço. Ver aquele homem retornando aos ringues, depois de nove anos de espera foi algo de proporções inimagináveis. O nosso grupo estava repleta de mensagens desconexas, em um momento em que todos nós queríamos demonstrar apenas uma coisa: emoção. Uma de nossas amigas, Laryssa, nos mandou um vídeo emocionada com o momento. E não era só ela. Todos nós estávamos ali, chorando, emocionados. Não um choro pesado e triste como o que alguns deram durante o dia. Mas um choro leve, de felicidade. A partir dali, todos nós estávamos em uma súbita onda de felicidade.

Onda esta que foi progressivamente aumentando. Com a reunião de Randy Orton e Edge, a Rated RKO. Com um momento cômico entre os dois. Ou então com a vitória da Royal Rumble, que foi conquistada por Drew McIntyre. Wrestler este que finalmente está ganhando o reconhecimento que tanto merece. Momento esse que trouxe mais um momento de alegria e euforia intensa para todos nós, que comemoramos, chorávamos e mandávamos mais mensagens desconexas. Momento esse que fez nossa outra amiga, Letícia, vir às lágrimas, pois viu a vitória de seu wrestler favorito em um dos grandes eventos do ano.

E por que estou lhes contando tudo isso, amigos? Pois tudo isso fez com que eu e meus amigos, nos sentíssemos como aquele Angelus de 12 anos se sentia em 2008 ao começar assistir WWE na emissora do tio Silvio. A irritação por causa do heel, a alegria quando os babyfaces apareceram. A felicidade imensa de ver o retorno de um dos nossos heróis e de ver aquele wrestler pelo qual torcemos tanto atingir a vitória. E foi quando veio uma frase no grupo e que não deixa de ser verdade: wrestling só é falso para quem não sente esse misto de emoções que todos nós sentimos ali. Aquela emoção, aquela euforia. O quão gigante foi esse momento de retorno que fez diversos wrestlers se manifestarem, mostrando a felicidade que sentiam por ver uma lenda de volta. O tanto de fãs emocionados pela internet mundo afora com esse momento que já se tornou lendário e inesquecível? Ver uma lenda retornando e um wrestler incrível, que por muito tempo dentro da WWE foi um mid-carder sem muita relevância antes de sua demissão, hoje conquistar uma vitória tão grandiosa. Isso só prova que nunca vai ser só wrestling. Independente de ser “falso” ou não.

Nada mais resume esse domingo do que a frase que Curt Hawkins postou em seu twitter:

“Ver o retorno de Edge esta noite colocou um sorriso em um meu rosto em um dia que eu acho que todos nós precisávamos desesperadamente de um. Obrigado.”

E é a mais pura verdade. Não havia como não sorrir. Foi uma noite incrível. Você pode achar falso, você pode achar besta. Mas para nós, que amamos isso e assistimos mesmo quando as coisas não estão em um grande nível de qualidade, isso é gratificante demais. Essa sensação compensa tudo. A WWE erra e erra muito, mas quando ela acerta, ela acerta. O que nos leva também ao RAW pós-Rumble, onde Edge finalizou o show. O Rated-R Superstar deu um discurso emocionado, fazendo todos nós enchermos os olhos d’água novamente. Aquele sentimento nostálgico tomou ainda mais conta com outra possibilidade de reviver a Rated-RKO.

Em seguida, heel turn de Randy Orton em um brutal ataque de cadeiras contra o pescoço de Edge. Lembre-se de que o wrestler se aposentou devido à uma lesão no pescoço que poderia colocar sua vida em risco. Mesmo com Orton tomando todo o cuidado possível durante o segmento, foi impossível eu e o pessoal do grupo não entrarmos em desespero e ficar agonizados. Um dos melhores finais de RAW em tempos e um dos mais desesperadores. Todos nós terminamos de assistir o show marcando uma consulta com o cardiologista.

Esse é o poder do pro-wrestling. Mexer com seus sentimentos, trazer essa nostalgia que abala você e faz você se sentir criança novamente. Lá estava eu: Angelus, 23 anos. Mas quem assistiu e sentiu tudo isso, de domingo até aqui foi aquele Angelus de 12 anos que jogou SmackDown vs. RAW 2008 pela primeira vez. E eu aposto que não só eu, mas como meus amigos, vocês leitores e todos os fãs que acompanharam tudo, se sentiram crianças novamente. Aquelas que acreditavam que Edge era realmente um cara mal e perverso e que Undertaker era um herói sobrenatural.

Eu termino esse textinho desengonçado, com uma mensagem que o nosso amigo Airton nos deixou antes de ir dormir após o Royal Rumble, que foi a mensagem que me inspirou a escrever esse texto:

“Se existisse um termo que fosse o inverso de banho de água fria, seria isso pra mim. É como se fosse a vida me falando pra não desistir das coisas, que até mesmo o que a gente já constata como impossível, na verdade, pode se tornar possível. Sempre acreditem.

Vou dormir pra acordar daqui às 5h, mas eu vou numa paz e leveza que há muito tempo eu não sentia. E eu amo a capacidade da WWE de fazer isso.”

Como não amar?

Foto: Twitter

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