Por 21 vezes, o universo do pro wrestling viu-se de frente de uma sequência icônica, que muitos acreditavam jamais ser quebrada. Era a streak de 21 vitórias de Undertaker nas Wrestlemanias, um recorde que fez do “Homem-morto” uma lenda viva, e ajudou o PPV a se tornar o mais importante evento de pro wrestling de todo o planeta. Tendo seu início com a derrota de Jimmy Snuka na Wrestlemania VII, no longínquo ano de 1991, ano após ano em que a streak era posta em jogo tornava-se cada vez mais inconcebível a hipótese da derrota do Undertaker. Era tido como certo a aposentadoria do wrestler e sua introdução ao hall da fama da empresa com a sequência intacta, porém, o destino teve outros planos. Ou melhor, os bookers tiveram outros planos: Brock Lesnar.
Em 6 de abril de 2014, a rivalidade de Undertaker e Brock Lesnar teria seu desfecho em uma batalha realizada na 30ª edição do Wrestlemania. Em qualquer outro esporte de luta, um lutador fora de seu auge físico como Undertaker não teria a menor chance contra um ex-campeão de MMA como Brock Lesnar, porém dentro da magia do espetáculo da luta livre era inverossímil a possibilidade da derrota de um veterano superstar pelas mãos de um atleta que nem mesmo se enquadra como um legítimo pro wrestler. Por esse pensamento, o choque se tornou muito maior para todos os fãs que eram familiares com ao menos parte da história dessa sequência, ao ver a queda de um mito pelas mãos da “Besta Encarnada”. A reação das pessoas naquela arena representava a mesma reação de todos os telespectadores ao redor do mundo: um silêncio longo e vazio. O simbólico número 0 de derrotas de Undertaker dava lugar ao número 1, transformando assim o certo “22-0” em um inacreditável “21-1”.
Sim, a streak tinha ali seu fim, fechava-se ali um dos capítulos mais marcantes da história da luta livre internacional (convenhamos, não faz mais sentido nenhum continuar contando a sequência mesmo com seu dono marcando presença em outras lutas dentro de novos Wrestlemanias). Por bastante tempo a derrota de Undertaker foi uma notícia difícil de engolir, e o motivo maior foi o fato de ser para Brock Lesnar. O motivo de longe não é a luta, os dois wrestlers mostraram uma química dentro do ringue que fez com que cada minuto fosse empolgante, o problema é o próprio Brock Lesnar. Não é segredo para ninguém que ele é obcecado por lucro próprio, pula de barco em barco não se satisfazendo com menos de alguns milhões em sua conta. Não o culpo, acredito que a maioria das pessoas incluindo a mim mesmo teria uma atitude semelhante estando em seu lugar. E na realidade, quem sou eu para julgar o modo como ele conduz sua vida pessoal. Porém, para a finalização de um legado mitológico dentro do pro wrestling, uma criatura que se tornou tão grande quanto seu criador, necessitava-se de um oponente a altura em honra da streak. Um pro wrestler com maior dignidade, e que acima de tudo, demonstrasse amor pelo aquilo que faz.
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Muitos nomes como melhor opção para a quebra da sequência foram postos, indo de John Cena à Sting. Após a luta, os mais diversos boatos surgiam, uns alegando que o próprio Brock não queria para si a responsabilidade de por fim naquela história de 23 anos, outros afirmando que o próprio Undertaker escolheu a dedo seu adversário para aquela função, e ainda os que dizem que Vince McMahon impôs seu papel de chefe contra a vontade de ambos wrestlers. Essas informações possivelmente nunca serão reveladas para nós, pobres mortais, porém o fato é que Brock Lesnar para sempre será o 1 naquele 21-1. E analisando mais friamente, a história poderia ser muito pior… Por isso, trago uma análise sobre alguns nomes que poderiam estragar mais do que Brock Lesnar o fim da streak de Undertaker. Acompanhem:
Roman Reigns
Por tempos a WWE quer impor Roman Reigns para o público, de todos os jeitos. O torna maior eliminador de wrestlers em um Royal Rumble e vencedor de uma das edições do evento, o coloca no main event de uma Wrestlemania, o insere em lutas pelo maior título da casa, até traz o apoio familiar do The Rock pra dar uma força. Porém, o resultado quase nunca é favorável a esses objetivos, tendo em vista que falta o principal fator para a ascensão do “Roman Empire”: carisma.
O sobrenome Anoa’i e sua força física não garantirá a Roman Reigns um futuro certo na WWE, isso se ele não focar pesadamente em sua conexão com o público. A WWE parece não ter conhecimento disso, e quer torná-lo um novo Rock antes de ele estar 100% pronto. Agora, caro leitor, imagine se em meio a isso, para que o plano de torná-lo um wrestler de ponta mais rapidamente, a solução apontada seria dar de presente a streak de Undertaker?
Todo o legado não seria nada mais do que apenas uma conquista na coleção de Roman Reigns, sem valor especial nenhum. E certamente, traria um prejuízo enorme para a empresa dos McMahons. Se após sua vitória no Royal Rumble nem a presença do eletrizante The Rock amenizou as vaias para Reigns, imagine o que aconteceria caso ele saísse vencedor de uma luta de alto garbo como essa. Ele nem precisaria do Undertaker para cavar a cova de sua carreira, ele mesmo faria isso sozinho.
Hulk Hogan
Essa é meio forçada, tenho de confessar. Se Undertaker está fora do seu ideal físico, imagine Hulk Hogan nos seus 60 e pouco anos intensamente vividos. O imortal a que lhe é atribuído não passa de um apelido. Entretanto, com a aproximação que o Hulkster teve com a WWE nos últimos tempos, não me surpreenderia a tentativa de colocar frente a frente duas lendas essenciais na história do esporte, tendo em jogo o título simbólico de maior prestígio. O markenting da empresa iria a loucura com essa notícia.
Porém, seria basicamente isso, uma luta mais de nomes do que de atletas. O ritmo seria bem lento, o tempo não seria tão prolongado. Dificilmente veríamos algo inovador dentro dessa luta, seria o mesmo wrestling old school, que corria o risco de se tornar desinteressante ao olhar do público. Seria mais uma luta em homenagem ao passado do que um legado para o futuro.
E mesmo que uma luta aceitável para os parâmetros modernos surgisse em um embate entre os dois, um fato totalmente acabaria com o legado da sequência. Recentemente, Hulk Hogan foi simplesmente riscado da história da WWE, após um escândalo de intolerância racial protagonizado pelo wrestler. Da noite para o dia Hogan não mais existiria para a WWE, como se não tivesse contribuído em nada para o crescimento da luta livre em âmbito nacional e internacional. Caso Hogan realmente se tornasse o primeiro a acabar com a sequência de Undertaker, esse fato também seria deletado dos arquivos. Imagine como que seria isso, a quebra da streak ser simplesmente apagada ou remodelada de alguma forma onde Hulk Hogan não fosse citado como ganhador. Essa é uma situação totalmente impensável, uma tragédia que denegriria anos de história em segundos.
Rusev
Ao longo do desenvolvimento dos EUA, inimigos foram criados pelo caminho e o sentimento patriótico se tornou marca dos norte-americanos. A luta livre se tornou, com o passar dos anos, um espelho disso. Os wrestlers personificados heróis americanos tinham de lutar a todo custo contra os vilões de nacionalidades contrárias, representando a luta cotidiana de seu povo na busca da paz e da justiça. Em diferentes épocas surgiam batalhas ideológicas com um alto nível de estereótipos entre o bem e o mal, que se resumia em EUA contra qualquer nação adversária. Assim, alemães, japoneses, canadenses, árabes, entre outros países, foram postas como ameaças a serem abatidas em nome do Tio Sam, que sempre tinham seu fim com alguma situação vexatória para a alegria da América. Uma dessas nações em especial destacava-se, sendo representada por diversas encarnações ao longo dos tempos: os russos. A mais recente ocorreu após o novo afrouxamento entre o governo de Obama e o de Putin. Rapidamente, a diretoria criativa da WWE transformou a gimmick do wrestler Rusev de um búlgaro que destruía tudo a sua frente para um búlgaro repatriado russo que destruía tudo a sua frente, principalmente americanos. Mudança nada sutil.
Bem, o que isso tem a ver com a streak do Undertaker? Rusev também tinha sua streak em sua curta caminhada pela WWE, uma pequena fileira de wrestlers americanos que foram deixados pra trás por ele durante vários PPVs. Não seria difícil imaginar uma luta entre ele e Undertaker, uma streak vs streak match. Seria algo no mínimo interessante de se ver, o público adotaria a ideia. Digamos que Rusev consiga derrotar Undertaker e demonstrar o poder da supremacia russa sob a americana, o que isso traria de bom para a streak? Um final indigno, a luta só seria um pretexto pra colocar mais lenha na fogueira, só uma peça dos bookers para continuar a acender o ódio dos americanos por outro povo para que de novo a América renascesse das cinzas pela mão de um novo wrestler americano, que agora tinha o dever de honrar o legado de Undertaker. Não sei por que, mas tenho quase certeza que esse wrestler seria o John Cena… A streak seria eternamente manchada por ter feito parte de um velho artifício como esse, por não teria um fim pensado como realmente merecia.
CM Punk
Punk e Taker já tiveram seu combate pela streak, a última vitória antes do 21-1. Foi uma luta perfeita, com uma storyline excelente. Com todo respeito que a carreira de Paul Bearer merece, a morte dele em meio a rivalidade entre os dois wrestlers trouxe um ar mais profundo e interessante para a história. Talvez naquele momento, não seria tão devastadora a vitória de CM Punk, ele seria um bom candidato a ser o responsável pela quebra da streak de Taker. Como dito, apenas naquele momento. Se analisarmos o que ocorreu com Punk após essa luta na Wrestlemania, podemos comprovar que seria um erro dar a ele um prêmio como esse.
Punk era um egocêntrico, e não sou eu que digo isso, e sim relatos de lutadores que já conviveram diariamente com o wrestler. Em sua saída repentina em 2014, foi reportado que um dos motivos para que isso tenha acontecido foi a consciência de Punk em saber que dificilmente alcançaria o topo novamente da forma que gostaria. Ou seja, ele queria permanecer eternamente no main event, sem dar chance a seus próprios companheiros de trabalho. Imagine o que acontecesse com seu ego se ele tivesse a streak de Undertaker em mãos, o que não iria querer para si. A streak seria apenas uma chave para seu sucesso dentro da empresa.
CM Punk foi embora, e os fãs continuavam a gritar seu nome show após show. Engraçado é que eles ovacionavam um wrestler que saiu sem dar uma mínima explicação satisfatória para os fãs que tanto o apoiavam, nem ao menos um singelo obrigado por anos de suporte. Caso você ainda discorde que Punk seria uma má escolha como conquistador da streak, ele próprio afirmou que não tinha interesse em lutar contra o Undertaker naquela Wrestlemania, e que sua paixão pelo wrestling se tornava zero. Se isso não é motivo o suficiente, eu não sei o que é.
O nome de Brock Lesnar como o escolhido para encerrar a Streak de Undertaker foi inesperado e surpreendente para todos os fãs de luta livre. Essa surpresa causou reações negativas e positivas, afinal são vinte e um anos em que aquele mito permanecia no imaginário dos fãs da empresa. Decidi então mostrar nomes que poderiam ser igualmente rejeitados ou até piores do que o de Lesnar. O nome trouxe um impacto de enormes proporções ao mundo do Pro-Wrestling, repercutiu como um desastre natural. Porém, o tempo passou, a Streak acabou nas mãos da Besta, por muitos fãs o momento já é aceito, e como diz o ditado, poderia ser pior.
Texto de Peter Pereira
ótimo artigo!!